
TEXTO Joana Vicente
Tal como nos humanos a maioria dos animais comunica com indivíduos da mesma espécie e consegue compreender o que indivíduos de outras espécies transmitem. Os meios de comunicação utilizados são muito variados, podendo passar pela utilização de sinais visuais, químicos, eléctricos, acústicos ou mecânicos. A utilização de mais do que uma das formas acima referidas, denomina-se comunicação multimodal. Por mais impressionante que pareça, alguns peixes possuem a capacidade de produzir sons e utilizam-no sem rituais de acasalamento e noutras interacções como, por exemplo, o confronto entre machos.
Alguns peixes possuem a capacidade de produzir sons
Na família Gobiidae existem muitas espécies que produzem sons. Composta por mais de duas mil espécies de peixes – marinhos, estuarinos e de água doce – esta família caracteriza-se não só pelo pequeno tamanho dos seus constituintes (a maior espécie consegue apenas atingir cerca de 30cm), como também pelo facto de as barbatanas peitorais poderem ser usadas como disco adesivo para se segurarem a rochas ou outros substratos.

Produzem dois tipos de sons, drums e thumps, sendo o primeiro usado para atrair as fêmeas. ILUSTRAÇÃO Manuel Vieira e Joana Vicente
Oiça os sons, o Drums:
e o Thumps:
Uma das espécies produtoras de sons, possível de encontrar ao longo da nossa costa, em zonas arenoso-rochosas a profundidades até 50m, é o Pomatoschistus pictus, também conhecido como góbio-pintado. Este é um pequeno peixe marinho com um tamanho máximo de cerca de 6cm reconhecido essencialmente pelo seu padrão de cor e pintas. Esta espécie distingue-se por dois conjuntos de pintas pretas na barbatana dorsal, e quatro conjuntos de pintas duplas ao longo da linha lateral. Machos e fêmeas podem ser distinguidos aquando da época de reprodução, na qual as fêmeas apresentam um abdómen distendido devido à presença dos ovos.

Habita zonas costeiras, em substratos arenosos e rochosos fazendo o seu ninho em conchas de bivalves. Podem ser encontrados em ambientes marinhos com temperaturas entre 5 e 22ºC. ILUSTRAÇÃO adaptação do mapa de John Harvey por Manuel Vieira e Joana Vicente
Aquando da preparação do ninho, geralmente feito em conchas de bivalves, o macho realiza movimentos caudais, levantando areia para cobrir o ninho. Este factor é igualmente tido em conta pelas fêmeas, uma vez que um ninho com muita areia por cima indica que os machos possuem uma boa capacidade de arejamento dos ovos, visto que são os machos os responsáveis pela incubação dos mesmos.
Os machos produzem sons para atrair as fêmeas
Os machos desta espécie atraem fêmeas para os seus ninhos na época de reprodução (de Janeiro a Maio) através de exibições visuais e acústicas. Produzem dois tipos de sons, thumps e drums mas apenas o segundo é usado para atrair as fêmeas. A preceder estes sons, o macho pode fazer um conjunto de movimentos de modo a tentar iniciar o ritual de acasalamento. As fêmeas têm a possibilidade de escolher o seu parceiro, pelo que podem decidir não acasalar com determinado macho. Nesta escolha parecem estar envolvidos diversos factores, tais como: o tamanho do macho e do ninho, e as características dos sons emitidos (duração, frequência, entre outros). Tudo isto são possíveis indicadores da qualidade do macho.
Quanto melhor a qualidade do macho maior a hipótese de sobrevivência dos ovos depositados pelas fêmeas e maior a probabilidade da passagem de melhores genes ao longo de gerações. Como acontece em muitos animais, a passagem dos melhores genes para as gerações seguintes é essencial não só a nível populacional mas também para a perpetuação da espécie.

Inicia-se muitas vezes com a produção de sons por parte do macho para atrair a fêmea para o interior do ninho (imagem no topo). Se a fêmea entrar no ninho, segue-se a produção de sons (drums) por parte do macho, enquanto a fêmea coloca a postura (ovos) no tecto do ninho. O macho toma regularmente a posição da fêmea para fertilizar os ovos (segunda imagem). No final a fêmea abandona o ninho e o macho fica encarregue de cuidar da postura durante a sua incubação (última imagem). ILUSTRAÇÃO Manuel Vieira e Joana Vicente
Bibliografia
Amorim, M. C. P., Neves, A. S. M. (2007) Acoustic signalling during courtship in the painted goby, Pomatoschistus pictus. Journal of the Marine Biological Association of the UK, 87: 1017.
Amorim, M. C. P., Neves, A. S. M. (2008) Male painted gobies (Pomatoschistus pictus) vocalise. Behaviour, 145: 1065–1083.