PINs: crimes anunciados a Sotavento
O património ambiental do Algarve foi mais uma vez palco de um crime, anunciado há muito, e perpetrado a coberto de um PIN (Projecto de Potencial Interesse Nacional).
A vítima foi desta vez a grande mancha de pinhal situada entre Altura e a Praia Verde (Castro Marim), conhecida como Pinhal do Gancho. O responsável foi o empreendimento Verdelago, projecto urbano-turístico de baixo nível de qualidade que nasceu de um despacho de excepção ao PROTAL, assinado por dois ministros do Governo em 1994, em vésperas de cessarem funções, e que recebeu o carimbo de PIN em 2006.
Após anos de expectativa, Verdelago levou a cabo, há cerca de um mês, o abate de várias centenas de pinheiros destruindo pura e simplesmente a totalidade daquela que era uma das maiores manchas verdes do litoral do Sotavento. Deste crime foi poupada uma pequena mancha de sobreiros, a qual, contra a expressa vontade dos responsáveis do empreendimento, acabaria por ser parcialmente salva "in extremis" por força da lei, mas que apenas irá servir de enfeite para os relvados e jardins das residências que substituirão as muitas árvores abatidas. Mais um exemplo do Algarve "de qualidade" que alguns grandes projectos prometem trazer para a região, mesmo que, pelo caminho, atropelem sem dó nem piedade parte da identidade paisagística da região e os seus valores naturais.
A propósito do Verdelago, a Almargem relembra que apresentou oportunamente uma queixa contra o Estado-Português junto da Comissão Europeia por violação do direito comunitário, concretamente pela afectação de vários habitats protegidos existentes naquela área, ao abrigo da legislação comunitária - Directiva n.º 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de Maio, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (Directiva Habitats), transposta para a ordem jurídica portuguesa pelo Decreto-Lei n.º 49/2005 (D.R. n.º 39, Série I-A de 2005-02-24), que alterou o Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de Abril.
Mas o que se torna ainda mais grave, é que o empreendimento Verdelago é apenas um exemplo do rol de projectos que um pouco por todo o Algarve há muito esperavam a sua vez para aparecer e que, agora, com o beneplácito do poder central e com regozijo de algum poder local, em troca de supostos milhões, se preparam para delapidar mais uma parte do património natural do Algarve. Nalgumas zonas é mesmo o pouco que resta, quer seja nos últimos troços de litoral ainda livres, quer seja no interior, em áreas de grande valor natural e paisagístico, onde sob o embuste de um desenvolvimento à custa de betão se promete fazer no interior o que é hoje o litoral... Um presente envenenado certamente não merecido por aquelas regiões, tudo isto com o contributo do Estado-Português que, contornando a legislação que ele próprio criou, e usando o dinheiro dos contribuintes, promove um modelo de desenvolvimento lesivo do verdadeiro interesse público que é proteger e valorizar o património natural e paisagístico de uma região.
A este propósito, faz-se notar que o concelho de Castro Marim é exemplar (a). Com base num PDM do qual há muito se reclama a revisão, eis que de uma assentada este concelho do Sotavento se prepara para receber 3 novos mega-projectos, sempre com a mesma receita “original”: hotel, aldeamentos, campo de golfe, marina.
Todos estes empreendimentos estão projectados nas margens do Guadiana, com vista para o betão que agora já preenche a margem espanhola - onde muitos viam um modelo a seguir, mas que agora já muitos dizem não querer. Ao que parece, até o grande parceiro internacional de um dos projectos anunciados para a margem portuguesa, já terá abandonado a parceria, de tão assustado que ficou com o que viu do lado espanhol: uma horrorosa parede de betão junto ao rio pomposamente chamada Costa Esuri.
Mas afinal este cenário é o que se perspectiva também para o lado português onde em nome do desenvolvimento do interior (?!), que continuará a desertificar-se, 3 empreendimentos, dois dos quais já classificados como PIN, ultrapassarão em poucos anos as 5000 camas, para além do Verdelago com mais 2000 camas.
Mais do mesmo, seja onde for, sem qualquer respeito pela identidade do espaço, sob a forma de projectos criadores de grande ilusão mas não de verdadeira riqueza, pelo menos para a maioria, com milhões prometidos (mas a que preço), e que se revelam muito pouco sustentáveis a longo prazo.
Apesar de todos os sinais de aviso - crise no imobiliário, perda da identidade regional, falta de competitividade face a destinos próximos - os poderes locais e regionais continuam, de forma míope e criminosa, a defender e promover um modelo já repetido vezes sem conta, agora sob o rótulo de um suposto selo de qualidade. Enquanto isso, aqui mesmo ao lado na vizinha Espanha, já se começam a verificar as primeiras tentativas de inverter a situação, nomeadamente no litoral, onde foram e continuam a ser cometidas muitas atrocidades ambientais, mas onde se começam já a implementar verdadeiras medidas de requalificação nas quais se incluem muitas demolições de construções erguidas abusivamente junto ao mar, devolvendo o litoral ao legítimo interesse público, para além de um reconhecimento político sobre a necessidade de reorientar o modelo turístico. Talvez seja, pois, o momento de olhar para o lado de lá com outros olhos.
No meio deste verdadeiro cenário de saque, a Almargem continua a acreditar (na medida do possível) que ainda é possível promover um turismo diferente no Algarve, de verdadeira qualidade, tirando partida do vasto património natural e cultural que a região possui, mas assente num modelo que possa promover riqueza para as populações locais e que seja igualmente capaz de salvaguardar os recursos da região numa perspectiva verdadeiramente sustentável. Se assim não for, dentro em breve será tarde de mais, e os muitos projectos que escaparam ao novo PROT, e outros tantos que espreitam os novos PDM, serão apenas marcas negras numa paisagem que poderia ser de ouro, mas que é cada vez mais de betão, mas com o carimbo de PIN.
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(a)
PINS Já aprovados para o Concelho de Castro Marim:
- Verdelago: hotel, aldeamentos e 2 campos de golfe (1ª licença de campo de golfe caducada em 2007) - 2000 camas.
- Corte Velho: hotel, aldeamentos e campo de golfe - chumbado em sede de AIA (2006) - 2300 camas.
- Quinta do Vale: hotel, aldeamentos, campo de golfe e marina - inaugurado em 2008.
... e ainda (para já sem PIN):
- Almada de Ouro: hotel, aldeamentos e 2 campos de golfe - 2800 camas.
Loulé, 7 de Dezembro de 2008
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